Criatividade sem limites: a feirinha do P1
por Mariana Dias
A feira que acontece no Prédio Principal da UFRRJ (P1) toda primeira semana do mês se tornou também uma relação de amizade entre seus realizadores e as pessoas que por ali passam.
Criatividades sem Limites é o nome do grupo de artesãs que se reúnem no P1 para expor seus trabalhos e vendê-los. O grupo surgiu em 2005, eram 10 mulheres que tinham o artesanato como atividade afim. Com a ajuda e o apoio do reitor da Universidade, conseguiram consolidar a feira. Hoje, são mais de 30 pessoas. Elas não pagam pelo espaço, apenas se organizaram entre si para reunir uma “caixinha” de R$10 mensais. Com este dinheiro, costumam realizar “festinhas” de confraternização de fim de ano, ou até mesmo comemoração de aniversários. Há três anos, o reitor solicitou que elas padronizassem a feira, visando dar um ar mais organizado e menos poluído ao prédio. Elas construíram um logotipo, um nome, um uniforme. Trocaram as barracas de ferro pelas bancadas e colocaram toalhas laranjas em todas elas, tudo objetivando a uniformização do local. Procuram manter-se organizadas. Possuem uma coordenadora, Maria Regina; duas secretárias, Rosangela e Roberta; uma tesoureira, Cátia; e três conselheiras fiscais, Nilsa, Fátima e Fábia.
As toalhas laranjas foram colocadas para a padronização da feira
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Foto de Mariana Dias |
O pré-requisito para estabelecer uma barraquinha na feira é produzir algo que ainda não exista por lá. O resultado é um produto diferente e caracterizado, até para que não se crie concorrência entre as expositoras. “O objetivo é expor produtos que se diferenciam e criar a partir daí um fluxo de amizades entre os artesãos.”- ressalta Rosangela.
Rosangela conta que a feira já foi realizada no ICHS durante o ano de 2009 e (uma vez) em 2010. Lá, até conseguiram um bom lucro, mas o espaço não comporta o número de barracas. Outro problema no local era a dificuldade de locomoção. No IB também já fizeram algumas vezes, mas a escassa movimentação de pessoas não gerou lucros.
As artesãs costumam ter um bom rendimento lucrativo durante o tempo que permanecem na Rural. No restante do mês, trabalham muito com encomendas.
Por que toda primeira semana do mês, Dona Luzinete?
O motivo de ser toda primeira semana é que as expositoras acabam tendo público, não apenas os alunos e funcionários da Universidade, mas também aposentados e moradores de Seropédica.
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Dona Luzinete em foto de Mariana Dias |
– É quando o pessoal vem ao banco pagar contas, receber a aposentadoria, resolver os problemas. A gente acaba revendo velhos amigos e não perdendo os vínculos com eles. – destaca a artesã Luzinete.
Ela tem sua barraquinha na feira há quase três anos. Faz puxa-saco para cozinha, toalha de mesa, peso de porta e tudo com estopa, que é o velho saco de batatas. Dona Luzinete contou que veio da Paraíba com nove anos. Quando chegou ao Rio, especificamente em Seropédica com sua família, sentiu muito a diferença com o clima local, já que aqui as estações eram bem definidas em cada época do ano, o inverno rigoroso demais para o que eles estavam acostumados. A mãe da artesã passou a colocar um forro nos “sacos de batatas” e usar como cobertor. “Foi o que nos salvou do frio.” – comenta emocionada. Ironicamente, hoje Luzinete usa a estopa para fazer seus artesanatos.
– Uma vez, há muito tempo, uma amiga me trouxe um puxa-saco de Brasília, feito de estopa, mas não era bordado com fitas. Depois de muito tempo de uso, já estava tão velho e resolvi reformá-lo. Então, surgiram esses que faço hoje.
Luzinete lembra ainda como começou a fazer seus artesanatos:
– Eu trabalhei a vida toda como funcionária publica, no Decanato de Graduação da Universidade. Foi meu primeiro e último emprego. A gente trabalhava muito. Eu peguei o momento em que as matrículas e todo o acompanhamento do estudante era feito por fichas, manuscritos. Depois de uma vida toda de mãe separada, cuidando da casa e vivendo pelo filho, me aposentei e não sabia o que fazer do meu tempo livre. Resolvi então começar a fazer esses trabalhos para dentro de minha casa. Depois, para as vizinhas e amigas. Elas sempre me diziam para eu expor o trabalho, mas eu tinha medo das pessoas não gostarem. Um dia, resolvi tentar, vim para a feira da Universidade. A gente gosta tanto daqui que, depois que se aposenta, não quer se desligar nunca!
Um nova forma de viver
Para a maioria dos artesãos, a feira é muito mais do que uma fonte complementar de renda. Quase todos são aposentados e encontraram ali uma nova forma de viver e de encarar a vida.
– Não é só pelo dinheiro sabe? É um jeito de fazer amigas, manter relações sociais, conhecer e conviver com pessoas novas e diferentes. – explica Dona Fábia, ex-professora do ICHS.
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Dona Fábia em foto de Mariana Dias |
Ela é aposentada há quatro anos, depois de ter dado aula durante 30 anos no curso de Administração. Após a aposentadoria, deparou-se com o mesmo problema que atinge muitos no Brasil, a ociosidade. Resolveu fazer um curso de decoupagem, com o objetivo de aprender a realizar decoração em caixinhas de madeira. Dentro desse curso, descobriu a arte-francesa. Desde então, trabalha com esse tipo de artesanato. A arte francesa consiste na montagem de quadros que têm imagens sobrepostas, e dá uma ilusão de movimentos.
– É um trabalho difícil e caro. As pessoas não costumam dar ao artesanato o valor que ele realmente tem. Mas eu não faço pelo dinheiro. Faço pela satisfação de fazer, para ocupar meu tempo e me distrair. – completa
Amizade
Amizade é como a secretária da organização
Criatividade sem Limites define a relação entre elas. Rosangela faz tricô e crochê, entre roupas e acessórios. Diz que é muito bom poder se sentir útil, ter sua própria fonte de renda e, além de tudo isso, ainda conseguir conviver com pessoas tão boas por perto.
– Meu marido trabalha na Universidade há muito tempo. Nós já moramos aqui dentro e minha relação com esse lugar é de longa data. Hoje, participo também do coral da Universidade e adoro! Eu não sabia que qualquer um da comunidade pode participar, achei que fosse destinado só a alunos.
Criatividade sem Limites não é apenas um feira, é um novo modo de encarar a vida para vários aposentados que perderam o sentido de viver depois da aposentadoria. Todos eles encontraram na feira uma nova forma de sentir-se útil e conviver com os outros. Ao andar pela feira, podemos observar senhoras conversando ao lado de suas bancas, trocando ideias, contando e relembrando histórias e até trocando receitas de bolo.
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Foto de Mariana Dias |
Vale a pena conferir, além de todo esse clima de alto astral, os produtos são muito interessantes. A feira comporta barracas com produtos realizados com fibras vegetais, crochê, bijuterias das mais variadas, blusas customizadas e bordadas, bolsas, chaveiros, produtos reciclados, quadros de óleo e acrílico, arte francesa, gesso e várias outros. Acontece toda primeira semana de cada mês, no corredor de entrada no P1, do lado direito. Das 8h até por volta das 17h30m, dependendo do movimento.